domingo, 10 de outubro de 2010

O teatro piegas do amor



Não fosse as condições da realidade, montaríamos mais uma vez o nosso melhor cenário. Incorporaríamos personagens únicas, nos vestiríamos de amantes, ensaiaríamos o quão preciso fosse. E, claro, como de costume faríamos dos sentimentos a plateia.

Nossa peça.
Éramos ponte-de-hidrogênio. A ligação mais forte de dois corpos - ou almas?
A minha intimidade, a sua - era tudo uma coisa só. Singulares plurais ou plurais singulares.

Mal sabíamos que nos encerraríamos em breve. Ou sim, sabíamos...
Contamos histórias, rimos, relembramos o primeiro beijo, a primeira transa, desabafamos, debochamos, nos libertamos. Esses clichês da paixão. Confessamos o que era preciso e nos perdoamos ali mesmo. Não tínhamos medo, vergonha, ameaças; nada assim. Ainda que tivéssemos suposto o fim - penso agora no sarcasmo do destino -, só nos importava o presente.

Que-charmoso-é-cada-detalhezinho-do-seu-corpo, eu repetia no seu ouvido. Desde os dedos do pé às curvas de uma mulher em uma menina, verdade. Seus olhinhos brlhavam e o ego estufava. Você fazia o mesmo: com você tem sabor, tem saudade, tem cor - dizias.

Fomos eternas por um momento.
Nos encaixamos. Adormecemos. Amanheceu.

Que delícia acordar com o seu sorriso. "Os barulhinhos que você faz quando desperta", era assim que se referia ao meu espreguiçar. Falava que era lindo, até. Beijo-com-gosto-de-quem-acabou-de-acordar, olhares-apaixonados-cheios-de-remela.

Achávamos tudo uma delícia. Vejam só. Acho que o amor tem dessas coisas de extrair beleza do que um dia foi nojo.

Talvez a cortina ainda se abra. Vá saber.

Um comentário:

GE disse...

Talvez ainda haja espaço para muitas coisas num tempo que não saberemos quando.

Um belo escrito.