segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Hoje eu quero sair só



Aqui é lindo. Se ainda fôssemos - verbo intransitivo - teria te carregado comigo. Não posso, não podemos. Procuro motivos para deixarmos de sermos doces. Não existem. Se isso é bom? Talvez. Não sei até quando.

A propósito, estava por te dizer, mas preferi calar: torço pra que essa barreira não seja medo. Qualquer outra coisa, baby. Medo não. Dilacera qualquer um - e por mais dilacerados que estejamos, ainda te quero doce.

As coisas estão tranquilas esta manhã. Tudo muito lindo, verdade. Uma paz e uma liberdade imensurável, sabe? Feito os nossos dias de sol. As árvores da praça dariam belas fotografias. No banco em que estou há uns rabiscos, não dá pra ser precisa, mas são dois nomes - ilegíveis - e um coração como elo. Os autores não sabiam a encrenca que os esperavam, provavelmente. As mulheres caminham com calma - calma esta que já fez uma delas passar por mim umas-trucentas-vezes. O yorkshire desta outra é uma graça - e você diria que sim, é uma graça mesmo. Os ônibus estão lotados - horário de pico, acho que é isso. Você poderia estar em um deles; não, não está. Que bom. Por isso vim.

Tenho ainda algumas horas - duas ou três. Leio mais um pouco, acendo outro cigarro depois que este apagar. E por falar em cigarro, me permita uma comparação grotesca: assim como sentimentos, apagam. Deixam um gosto ruim, um gosto acre na boca. Depois passa. Não é mais ou menos assim que funciona?

Me deito no banco, admiro as nuvens, invento formatos, guardo na memória algum deles enquanto elas se desfazem.

Cá entre nós, o que destroi mesmo é essa consciência de que vai-passar. Bob Dylan entra em cena: It's all right man. Im just bleeding. Sim, tudo certo. Errado estaria se o desfecho não me incomodasse.

By the way, tem uma velhinha tão fofa sentada no banco ao lado. Lê um jornal, tem um semblante bom. Parece não ter medo de nada - se tem, felizmente não o identifiquei, há coisa mais bela que não ter medo de viver?; Ouvi, sem querer querendo, ela dizer: "Antigamente catapora era doença à toa. Hoje não." Tá vendo só, baby? Não tem jeito mesmo. Toda beleza tem seu lado nem-tão-belo-assim. Toda doçura tem seu fel.

Resisto, peço: não precisa ser doce, mas que não seja tão amargo também.

E que venha a vida. Pra você. Pra mim. Pra nós.

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